<BODY><script type="text/javascript"> function setAttributeOnload(object, attribute, val) { if(window.addEventListener) { window.addEventListener('load', function(){ object[attribute] = val; }, false); } else { window.attachEvent('onload', function(){ object[attribute] = val; }); } } </script> <div id="navbar-iframe-container"></div> <script type="text/javascript" src="https://apis.google.com/js/platform.js"></script> <script type="text/javascript"> gapi.load("gapi.iframes:gapi.iframes.style.bubble", function() { if (gapi.iframes && gapi.iframes.getContext) { gapi.iframes.getContext().openChild({ url: 'https://www.blogger.com/navbar/8825347287246798898?origin\x3dhttp://filovest.blogspot.com', where: document.getElementById("navbar-iframe-container"), id: "navbar-iframe" }); } }); </script>

Categorias


Twitter:


Sites de Universidades


Casa grande e senzala
quinta-feira, 29 de janeiro de 2009

De sociologia
Escrito em 1933, “Casa Grande e Senzala” é uma obra que quase dispensa apresentações. Primeiro livro de uma série de outros indispensáveis para compreender o Brasil - “Raízes do Brasil”, de Sérgio Buarque de Hollanda; “Formação do Brasil Contemporãneo” de Caio Prado Júnior, os “Donos do Poder”, de Raymundo Faoro, e, mais tarde, “Formação Econômica do Brasil”, de Celso Furtado – logo chamou atenção pela reflexão inovadora, pelo estilo literário, pela força revolucionária. De lá pra cá, a verdade é que ninguém escapa da grande obra de Gilberto Freyre, nem mesmo os mais contrários. Aqui se tentará fazer uma apresentação o mais possível sucinta desta “façanha da cultura brasileira” – como afirma o antropólogo Darcy Ribeiro.

Gilberto Freyre se propõe a fazer um esforço histórico-hermenêutico, abrangendo as características gerais da colonização portuguesa nos trópicos e os elementos étnicos – índio, negro, português – que formaram o Brasil.

Era mesmo o português, por uma série de antecedentes históricos, predestinado à colonização híbrida e excravocrata que se deu no Brasil. Gilberto Freyre pinta com os seguintes traços o quadro de Portugal: o país era marcado por “mobilidade”, resultante da sua expansão marítima e comercial, que chegara a colonizar regiões da África e da Índia; pela “miscibilidade”, isto é, uma vez que os portugueses sempre tiveram o caráter de povo indefinido entre Europa e África, miscigenaram-se logo eles com os mouros; pela “aclimatabilidade”, ou seja, sendo o clima imperante no reino bem próximo ao do africano, não encontraria o português grandes de dificuldades da adaptação ao sol dos trópicos. Além destes traços, acrescente-se a rigidez da moral católica amaciada pelo contato com a maometana; a posição geográfica privilegiada, capaz de favorecer o cosmopolitismo, a miscibilidade, a mobilidade; a escravidão do mouro, à qual o português já estava tão habituado; e, finalmente, a precoce ascendência da burguesia, de quem se tornaram aliados os reis contra a nobreza

Desta forma, foi possível à Portugal, enfrentando toda a sorte de obstáculos que impuseram-se à colonização do Brasil – condições metereológicas, alimentares e geológicas adversas - fazer obra criadora, original, não somente de exploração econômica ou domínio político, mas verdadeira expansão étnica. A isto não pode aspirar a colonização inglesa na América do Norte nem a espanhola na Argentina.

Outra característica que diferencia a colonização do Brasil destas outras realizadas na América é a delegação da tarefa colonizadora à iniciativa do particular. Muito mais do que a ação oficial, foi a corajosa iniciativa particular que dispôs-se a povoar e a defender militarmente o Brasil dos primeiros séculos, promovendo e consolidando a mistura de raças, a agricultura latifundiária e a escravidão. A família torna-se assim força social que se desdobra em política, dando marcas de oligarquismo e nepotismo ao mando político.

Ao lado e muitas vezes concorrendo com esta ação do particular, os jesuítas conformaram, densificaram a moral da sociedade colonial através da educação. Não é exagero dizer que o catolicismo foi o cimento de nossa unidade, pois este foi capaz de gerar solidariedade entre os grupos geograficamente tão dispersos na nova colônia e de suprir a falta de consciência de raça do português.

Constitui-se assim a sociedade agrária, escravocrata e híbrida do Brasil Colônia. E constitui-se ao lado de tantas dificuldades: juntamente à miscigenação e à poligamia, convivem a expansão da sífilis e o precário regime alimentar da colônia.

É nesta sociedade que Gilberto Freyre identifica o sadismo do senhor e o masoquismo do escravo, que excedem-se da vida sexual e doméstica e fazem-se sentir em campo mais largo: o social e o político. Contudo, o autor afirma que é justamente o equilíbrio entre sadistas e masoquistas, senhores e escravos, doutores e analfabetos que gera confluência positiva de qualidades de uns e de outros. Haveria então fusão harmoniosa de tais tradições diversas ou mesmo antagônicas; a formação brasileira teria sido um processo de equilíbrios entre antagonismos (de economia e de cultura), equilíbrio que teria se dado através da miscigenação, dispersão de herança, do cristianismo antes “lírico” do que rígido, da tolerância moral, da hospitalidade, etc.

Sob esta perspectiva de confluência positiva de antagonismos, Gilberto Freyre trata dos outros elementos étnicos que, além do português, formaram a cultura e sociedade brasileiras: o índio e o negro.
De sociologia
No tocante ao índio, é preciso assinalar que, se comparado à colonização espanhola e à inglesa, a portuguesa foi marcada por uma maior reciprocidade cultural; ocorreu aqui um processo de degradação de cultura mais sutil e mais lento que em outras partes da América.
Por um lado, o índio desempenhou no Brasil papel de sujeito, transformando a cultura da colônia: através do homem indígena foi possível o devastamento e conquista dos sertões e a defesa da colônia; a mulher indígena divulgou vários processos e conhecimentos agrícolas, de alimentos e de saúde; do menino indígena, que inverteu o processo civilizador ao educar os pais, vieram elementos morais indígenas combinados já ao conhecimento da língua do dominador e de seus costumes. Ainda subsiste em nossa dieta, vida íntima, costumes, influência do fetichismo, totemismo, dos tabus ameríndios.
De sociologia

Por outro lado, o índio também sofreu extermínio e degradação; a religião católica e a língua tiveram papel deculturador; o contato com o português dissolveu a cultura indígena; jesuítas e colonos foram responsáveis por despovoamento, degeneração e degradação das populações indígenas, vitimadas por mortes, doenças, maus tratos – a escravidão.

O tema da escravidão nos leva ao outro elemento étnico que formou o Brasil: o negro, sobretudo o do estoque banto e sudanês. Por que a opção do português, na segunda etapa de colonização – quando assentou-se a monocultura escravista latifundiária - pelo negro ao invés do índio? Comparando as duas etnias, temos uma superioridade técnica e de cultura dos negros; uma incapacidade social e técnica do ameríndio para a escravidão, para quem havia sido tão brusca a passagem do nomadismo para a sedentariedade, da atividade esporádica à contínua. O negro, vindo de um estágio de cultura superior, corresponderia melhor à necessidade do trabalho regular nos engenhos de açúcar.

No tocante ao negro, é necessário distinguir a escravidão nas colônias inglesas, onde o critério de importação dos cativos foi quase exclusivamente agrícola, da escravidão no Brasil, que visava igualmente outros interesses – falta de mulheres brancas e necessidade de técnicos em trabalho de metal.

É necessário ainda distinguir a influência pura do negro e do negro na condição de escravo. Eventuais más influências que poderíamos ter recebido da África não são responsabilidade do negro, mas consequências do sistema social da escravidão. A condição degradante de escravo abafou do negro uitas de suas melhores tendências criadoras e normais para acentuarem-se outras artificiais ou até mórbidas.
Assim como o índio, ou ainda mais que ele, o negro exerceu papel de sujeito no Brasil escravocrata. A ama negra (responsável pela amamentação) e o moleque (companheiro – ou vítima – de brincadeiras e jogos sádicos) influenciaram em muito o menino de engenho; igual papel exerceram as mucamas, que introduziram mistérios do amor às sinhazinhas; a nossa língua portuguesa foi modificada, amolecida, pela interpenetração das culturas da casa grande e da senzaça; os negros foram não somente escravos mas também barbeiros, músicos, dentistas, professores, etc. A própria religião católica, se exerceu função deculturadora dos escravos, por outro lado se impregnou de influências maometanas. A culinária brasileira é fartísssima, também, de características africanas.

E não foi só isso: para Gilberto Freure, pode-se falar mesmo numa “doçura” nas relações de senhores com escravos, se comparado a outras partes da América. Muitos dos escravos domésticos eram tratados como pessoas da família; eram acolhidos pelo catolicismo lírico e doméstico da casa grande; eram agraciados não raramente com parte do testamento do senhor; uniam-se frequentemente as negras e mulatas com homens abastados; e foi-se permitido aos africanos preservarem consideráveis parcelas de sua cultura.

Não obstante tais (polêmicas) afirmações, o autor não deixa de indicar a amargura dos escravos. Os abusos do regime do trabalho; a alta mortalidade infantil; o sistema econômico que dividiu, como um Deus poderoso, senhores e escravos. Não foi toda de alegria a vida dos escravos: houve os que se suicidaram comendo terra, enforcando-se, envenenando-se; o banzo (saudades da África) também deu cabo de muitos..
De toda a saborosa trajetória de Freyre pelas características da sociedade patriarcal brasileira e das etnias que formaram o Brasil, podemos chegar a algumas conclusões. A primeira é que para o autor a sociedade brasileira é de todas da América a que se constitui mais harmoniosamente quanto às relações de raça; onde houve maior reciprocidade cultural. Ele não deixa de assinalar o déficit humano gigantesto que resultou do contato do português com o índio e o negro; mas a sua conclusão é pela fusão harmoniosa entre eles numa só cultura original.

“Casa Grande e Senzala” foi e tem sido muito criticado pela visão “casa grande” do autor; pela construção do mito da democracia racial; pela superficialidade na abordadem do indígena (Florestan Fernandes ironiza a superficialidade da assertiva “o açucar matou o índio”; Darcy Ribeiro critica o desprezo de Freyre pela influência no índio na agricultura); pela desconsideração da escravaria do eito – o negro que trabalhava nas plantações – em favor do escravo doméstico – de vida muito menos desgastante. Contudo, mesmo seus críticos não podem deixar de deliciar-se com seu estilo literário; de admirar-se da perspectiva inovadora do papel do jesuíta e do enorme peso conferido por Freyre ao sistema escravista pelas influências deletérias do negro. A todos chama atenção a habilidade do autor em utilizar uma pluralidade de métodos científicos para o tratamento dos temas.

Há um momento no livro que Gilberto Freyre deixa escapar que a força, ou o potencial, da cultura brasileira é a de equilibrar-se sobre antagonismos. De maneira análoga, podemos afirmar que a força e a permanência de “Casa Grande e Senzala” residem justamente em ser um livro tão recheado de ambiguidades e apoiado equilibradamente sobre antagonismos.

Todos os créditos desse trabalho vão para Nil Castro: www.poppycorn.com.br
É raro ver um texto tão bem elaborado sobre sociologia, parabéns Nil.

<< Página inicial